sexta-feira, 28 de maio de 2010

Banditismo Lampirônico (ou Lampião e o Cangaço)


Herói ou vilão? Mocinho e bandido! Virgolino Ferreira da silva, mas conhecido como “Lampião”, foi temido e admirado por toda região nordeste, o mito do cangaceiro justiceiro vive até hoje no imaginário deste povo. Nascido no município de Vila Bela (atual Serra Talhada-PE), Virgolino (04/06/1898- 28/07/1938) e sua família são ameaçados em 1915 por capangas da família Nogueira, grande família latifundiária da época. Virgolino tem seu pai espancado, como era de costume no sertão a lei do “olho por olho, dente por dente” assim se fez. Juntamente com seu irmão Ezequiel, Virgolino mata dois capangas dos Nogueira e foge com toda sua família para o estado de Alagoas. Lá seu pai é executado por capangas de que família? Nogueira, claro. Aos 21 anos, percebendo que o poder publico não agia em pró dos humildes, resolveu fazer justiça com as próprias mãos e criar suas próprias leis. Era chamado Lampião pelo fato de atirar muito bem no escuro e no disparar da sua arma, surgiam faíscas que lembravam a luz de um lampião.

No ano de 1920, Lampião entra para o bando de Sebastião Pereira, dois anos mais tarde S. Pereira abandona o cangaço e passa o posto de chefe a Lampião. Durante sua curta jornada na vida de banditismo, Lampião e seu bando por onde passava aterroriza fazendas, cidades e vilas. É verdade que haviam outros grupos de cangaceiros, mas nenhum foi tão famoso quanto o bando de Lampião. Virgolino não perdoava o enriquecimento ilícito dos coronéis, abominava a exploração dos grandes contra os pequenos agricultores. Em suma, lutava e tentava combater as injustiças sociais no NE. Porém ao mesmo tempo, aterrorizava e pilhava as localidades por onde passava. Lampião também faz parte do imaginário nordestino por suas batalhas “homéricas” na caatinga e pelos julgamentos que fazia nas praças publicas.

Na cultura do cangaço não havia perdão nem justificativa para traição, estupro e falsidade. A lealdade para com os paradigmas do cangaço era tão forte que até mesmo cangaceiros do seu bando quando faziam algo errado eram julgados como um réu qualquer. Apesar de semi-analfabeto Lampião gostava de ler jornais e escrever cartas a grandes lideres políticos das cidades por onde passava. Tais cartas sempre vinham acompanhadas de algumas reivindicações (e alguns tantos erros de português!). Também se deixou ser fotografado e filmado, em certas ocasiões (como bom estrategista que era) usava a imprensa a seu favor. Também era um exímio costureiro. Engana-se quem acha que as vestimentas do cangaço eram sem cor e sem brilho, pois, apesar de serem feitas de couro não deixavam de ter ornamentações confeccionadas pelos próprios cangaceiros, enfeites que iam do aplique de pedras preciosas aos bordados e crochês. Os chapéus era um caso a parte, sempre imponentes e inconfundíveis, cada cangaceiro tinha um zelo especial para com o seu, pois o chapéu de um cangaceiro refletia seu perfil. Lampião por exemplo, colava moedas antigas e valiosas no seu.

Graças aos cangaceiros hoje podemos dançar o “Xaxado”, dança criada pelos bandoleiros para tentar esquecer a solidão e a falta d’uma vida alegre e estável. Servia também como dança de guerra, na falta de mulheres eles dançavam com suas armas e até mesmo homem com homem, o que é um paradoxo diante do conceito de “cabra macho” no NE. Em 1929, com a chegada de Maria Bonita (que fugira do marido sapateiro para viver com o valente cangaceiro) começou a se aceitar mulheres no bando, quebrando assim mais uma vez outro paradigma nordestino, o de que a mulher é um ser frágil e que traz azar. Lampião reformulou as tradições dos grupos de insurgentes bandoleiros do Nordeste, em pleno agreste brasileiro o semi-analfabeto e por muitos tachados como bandido, de uma maneira bem peculiar estava fazendo cultura, já se foi citado exemplos aqui como a própria musica-dança Xaxado e os adornos nos bizacos e gibões destes guerrilheiros sertanejos. Podemos notar também como herança do cangaço o comportamento e paradigmas dos vaqueiros sertanejos de hoje.

Lampião foi uma espécie de “Robin Wood” brasileiro, pois, algumas vezes roubava dos ricos e doava parte aos pobres, com isso, o mesmo ganhava apoio da população local, dava e recebia proteção. Também era subsidiado por alguns coronéis. Pousava em algumas fazendas quando a coisa apertava e as volantes o perseguiam. “Deu fim a muitos macacos” (matou muitos policiais) por essas fazendas sertanejas. Seu bando era odiado pelo governo, respeitado e temido pelos civis “matutos”.

A captura do bando se tornava difícil, pois, a população local na maioria das vezes simpatizava pela causa de luta dos cangaceiros. Em 1926, por intermédio de Pe. Cícero (pessoa que Virgolino respeitava muito) recebeu o convite para combater a coluna Prestes (coluna comunista que tentou tomar o poder no país e combater a ditadura direitista da época), junto com o convite veio à patente de capitão honorário das forças legais, armamento e munição. Só que, Lampião recusou-se a combater tal coluna e a partir daí resolveu durante todo resto de sua vida carregar consigo a patente de Capitão, que segundo ele fora dada por Pe. Cícero e não pelo governo. Lampião com esse episódio conseguiu mais uma contradição na história, pois, um bandoleiro fora da lei recebeu o convite e a patente de capitão do exercito brasileiro para combater ao lado do estado!

Há mais estórias sobre Virgolino Ferreira da Silva nas entrelinhas do tempo que a nossa vã filosofia possa imaginar, alguns desses relatos cientificamente comprovados, outros nem tanto. Mas, o importante é que Lampião e seus cangaceiros entraram para a história do NE, nos sete estados (PE, BA, SE, AL, PB, RN e CE) que passaram, causaram um misto de respeito e indignação, empatia e ódio, Um bom exemplo é que em PE Lampião é visto como herói, já em SE é tido como bandido. Dicotomias que a história prega nas biografias de grandes figuras, Julgamentos a parte... Chega ao fim na madrugada chuvosa da cidade de Porto folha, na fazenda sergipana “Angicos” em 28 de Julho do ano 38, Lampião, Maria Bonita e mais nove de seu bando, perdiam a vida numa emboscada realizada por militares da policia alagoana comandados pelo tenente João Bezerra. As cabeças dos bandoleiros foram enviadas a Salvador-BA onde ficaram expostas em um museu por mais de vinte anos.

O cangaço ainda continuou vivo, porém, não mais o mesmo. Sem seu principal “capitão” os “soldados” do cangaço se encontravam desmotivados, tomaram rumos mais seguros para suas vidas. Se Lampião foi o mocinho ou o bandido não cabe esse artigo julgá-lo, o certo é que por essas bandas nunca mais apareceu um líder estrategista como Virgolino Ferreira da Silva.

Nenhum comentário:

Postar um comentário