Como disse Eric Hobsbawn; “O historiador tem a função de lembrar o que o povo esquece”. Sendo assim, resolvi neste artigo abordar um pouco da história da nossa capital: surgimento, modernização, belezas naturais, riquezas culturais e desigualdades sociais.
Recife surge em meados do século XVI e se torna uma das primeiras cidades brasileiras, não só no que diz respeito à data de sua fundação como também em importância político-econômica. No século XVII o Recife era primeiro lugar na produção de açúcar. Com a invasão holandesa 1630-1654, a então cidade Mauricia (nome dado a cidade durante o domínio holandês) se desenvolve ainda mais, tanto na produção açucareira como na urbanização. É graças a Olinda e Recife que, nessa época, Pernambuco juntamente com São Vicente se tornam as capitanias hereditárias mais promissoras da colônia. Entretanto, durante algumas revoltas como: as Batalhas dos Guararapes (a primeira em 19 de Abril de 1648 e a segunda em 19 de Fevereiro de 1649) os holandeses são expulsos e o Recife mais uma vez fica sobre dominuo portugues. Já no século XVIII a produção de açucar decai, perdendo mercado para as Antilhas (não por coenscidência pertencente a Holanda). O declinio do açucar gerou mais revoltas até que na Guerra dos Mascates (1710) Recife ganha autonomia e se desvincula de Olinda. Com Recife crescendo mais uma vez, os senhores de algodão e os coroneis de gado começam a ganhar espaço no cenário local. Na segunda metade do século XVIII e primeira metade do século XIX Recife ainda era a 3ª cidade mais importante do império graças as exportações do velho e conhecido açúcar e do algodão, chamado por muitos de “ouro branco”. O progresso se aproximava da provincia de Pernambuco e em 1870 é aberta a estrada de ferro Recife-Olinda-Beberibe, que serviu basicamente para escoar a produção local. Também é nessa época que surge o serviço telegráfo e a telefonia manual. Por trás do progresso e prossesso de urbanização recifense, a população se mostrou critica as praticas impostas pelas classes dominantes tanto no Brasil Colônia (1500-1821) quanto no Brasil Império (1822-1889), se organizaram e reagiram, mostrando-se desde sempre indgnados com as injustiças sociais. A exemplo podemos citar as revoltas armadas da Revolução Pernambucana (1817) e a Confederação do Equador (1824). Porém nesse artigo darei enfoque a outro tipo de revolução, a “Revolução Musical” através da cena Mangue beat.
Desde as primeiras décadas do século XX a política cultural do Recife era preservar as tradições folclóricas local, repudiava-se o vindo de fora, não só os governantes da época como também os ativistas culturais acreditavam que, as práticas culturais vindas de fora empobreciam a essência cultural pernambucana. É dentro deste contexto que nos anos 60 o então governador de Pernambuco Miguel Arraes cria as Praças de Cultura, projeto esse que serviu de modelo para os CPC’s (Centros Populares de Cultura) da União Nacional dos Estudantes (UNE). Na década de 1970, durante o período da ditadura militar (1964-1985) a cidade sofre considerável declínio cultural, com a implantação do regime militar no Brasil, as políticas culturais ficam em terceiro plano, fato lastimável, tendo em vista que as praticas culturais já tem dificuldades com incentivos e o sem apoio governista a situação se torna ainda mais difícil de serem praticadas, difundidas e divulgadas. Durante os vinte e um anos em que a ditadura militar esteve em vigor podemos notar a ausência das leis de incentivo a cultura brasileira, conseqüentemente fadada ao esquecimento, sendo assim: “o Homem é como um cão sem plumas, está fadado a miséria” (MELO, Neto. Paisagem do Capibaribe – 1994. p.108). Fazendo uma releitura desta frase, podemos dizer que, durante o nefasto período ditatorial, a maioria dos brasileiros viviam em plena miséria cultural e intelectual. A situação não ia de mal a pior só no campo político e cultural como também no campo econômico, pois, nos anos 80 Recife perde a patente de terceira maior economia do país para cair em degradação social e receber nos anos noventa, o titulo de 4ª pior cidade do mundo para se viver.
“Recife, a cidade dos rios, das pontes e das antigas residências palacianas é também a cidade dos mocambos: das cochas, dos casebres de barro batido a sopapo, cobertas de capim, de palha de coqueiro e de folhas de flândes” (Castro 1967 p. 27).
A cidade do Recife é composta de três ilhas e várias pontes, sendo denominada “cidade estuário”, foi construída às margens do Rio Capibaribe, rio esse de nascente localizada no agreste pernambucano, na serra do Jacarará, entre as cidades de Jataúba e Poção. De extensão 250 km, possui 74 afluentes e banha 43 cidades ao longo do seu curso. É citado como parte vital da região em reportagens televisivas e jornalísticas, mini-séries, poemas e livros como Morte e vida Severina e O Rio, ambos de autoria de João Cabral de Melo Neto. De suma importância também para a cidade do Recife é o rio Beberibe, que nasce na cidade de Camaragibe e tem 19 Km. Recife é chamada “Veneza Brasileira”, por ser cortada em vários pontos por esses dois rios. Sendo assim, podemos dizer que a cidade do Recife é uma cidade “anfíbia”, com seus rios e suas pontes antigas como a ponte Mauricio de Nassau (herança holandesa) e a Ponte da Boa Vista, que serve para ligar a cidade histórica com a cidade moderna, ilha a continente. É por essas artérias (pontes) que glóbulos brancos e células cancerígenas (pessoas de boa e má fé) também circulam no coração da Manguetown (cidade mangue). João Cabral de Melo Neto em sua literatura deixa bem intrínseco essa idéia, quando fala: “Esta foi a minha Sorbonne: a lama dos mangues de Recife, fervilhando de seres humanos feitos de carne de caranguejo, pensando e sentindo como caranguejo”. É impossível não ligar metáforas a vida caótica, porém poética da cidade do Recife.
No inicio dos anos 90 Recife (culturalmente falando) encontrava-se como uma “cidade passiva”, nada de significativo para e pelos jovens era produzido. Neste período o Movimento Armorial com incentivo do governo se destacava, porém a política cultural para o jovem, principalmente da periferia era quase que zero. A situação chegou a tal ponto que uma matéria publicada no dia 26 de Novembro de 1990 pelo Jornal do Comércio relatava uma pesquisa feita pelo instituto Population Crisis Committe de Washington-EUA, onde Recife era considera a 4º pior cidade do mundo para se viver. Em suma, a cidade do Recife vivia um ócio cultural produtivo e o poder publico da época nada fazia para melhorar a situação. O quadro era alarmante, relatos da época de maneira irônica, informam que, caso o leitor espremesse os jornais saia sangue de tanta violência a qual a cidade estava fadada a presenciar. Era preciso mudar esse quadro e colocar Recife em evidencia positiva, para que a cidade voltasse a ser a boa e velha “Veneza brasileira” dos poetas de outrora.
“Toda esta terra que hoje flutua a flor das águas, na baia entulhada do Recife, foi uma criação dos mangues” (Josué de Castro).
Em meados do século XX, a cidade ainda se encontrava repleta de casarões. Com o declínio do Açúcar e do Algodão no nordeste muitos destes casarões estavam abandonados e inabitáveis, já não sendo possível acompanhar o “progresso” e a modernidade. Para que a modernidade chegasse foi necessário implantar no Recife, ruas largas, compridas e avenidas à “americana”. Para dar o ar de modernidade, os casarões cederam espaço para as construções verticais. Porém, como prega a terceira lei de Newton, para toda ação existe uma reação e durante o processo de modernização da cidade aterraram os manguezais, pois precisavam de espaço para erguer as novas construções.
Pouco é feito para inibir as mega empreiteiras. Existe um jogo de interesse político nas entrelinhas do discurso por parte do poder publico que diz ser "impossível frear o progresso”, progresso esse que polui rios e matas, lançam diariamente toneladas de detritos tóxicos, empurra a população necessitada e carente para margens destes rios que, por sinal se tornam esgotos a céu aperto. Será que é justo o preço pago pela natureza, onde poucos desfrutam das maravilhas do progresso e muitos vivem marginalizados sem qualquer expectativa de vida futura?
“Toda esta terra que hoje flutua a flor das águas, na baia entulhada do Recife, foi uma criação dos mangues” (Josué de Castro).
Em meados do século XX, a cidade ainda se encontrava repleta de casarões. Com o declínio do Açúcar e do Algodão no nordeste muitos destes casarões estavam abandonados e inabitáveis, já não sendo possível acompanhar o “progresso” e a modernidade. Para que a modernidade chegasse foi necessário implantar no Recife, ruas largas, compridas e avenidas à “americana”. Para dar o ar de modernidade, os casarões cederam espaço para as construções verticais. Porém, como prega a terceira lei de Newton, para toda ação existe uma reação e durante o processo de modernização da cidade aterraram os manguezais, pois precisavam de espaço para erguer as novas construções.
Junto com o progresso veio à deterioração da biodiversidade ao redor da cidade, do muito que se tinha, hoje sobrou pouco ou quase nada. As leis de preservação estão no papel, porém pouco se faz para fiscalizar e punir quem desrespeita o meio ambiente e o ecossistema local. Fato preocupante, tendo em vista que 15 % dos mangues mundiais estão no Brasil, tal ecossistema só é encontrado em regiões tropicais e subtropicais, 90% dos alimentos marítimos vem do mangue.
“As margens do Capibaribe são o paraíso do caranguejo. Se a terra foi feita para o homem com tudo para o bem servi-lo, também o mangue foi feita especialmente para o caranguejo, tudo aí é, foi ou está para o caranguejo, inclusive a lama e o homem que vive nela. Por outro lado o homem daí vive para pegar caranguejo, chupa-lhes as patas, comer-lhe a sua carne feita de lama, o que o organismo rejeita volta como detrito para a lama do mangue, para virar caranguejo outra vez” (CASTRO apud REZENDE, Antônio Paulo. O Recife: histórias de uma cidade. 2. ed. Recife: Fundação de cultura da cidade do Recife, 2005, p. 207).
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