quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012

Chico Science


No dia 13 de Março de 1966 nascia no bairro de Rio Doce, na cidade de Olinda-PE, o caçula de quatro filhos (Francisco de Assis França). Na infância teve crises de asma até os 8 anos. Sua mãe queria que o filho ao crescer se tornasse padre. Passou a adolescência em meio a Caranguejos Uçá, Gaiamuns e Aratus, brincando e fazendo traquinagens; jogando pião, correndo atrás de bola, empinando pipa e tomando banho de rio.

Fazia bicos para ganhar dinheiro e ir aos bailes Funks, na época, denominado de Miami Bass, música Black americana, portanto, diferente do funk carioca. O tempo passa e na sua fase adulta Chico termina o segundo grau (ensino médio), se torna funcionário publico. Seu pai, natural de Surubim-PE, Chegou a ser vereador de Olinda. Gostava de cantoria, de Repente e Cordel e atualmente trabalha no Espaço Ciência, em Olinda. Foi com o seu pai que Chico tomou gosto pela sonoridade regional e foi com a ajuda de Chico, (que fez o slogan da campanha) que seu pai exerceu o mandato de 1984-1988.  “Povo de Rio Doce/ Vote com confiança /para vereador/ vote em Luiz de França (Chico Science).

Até então, ninguém imaginaria que um jovem vindo da periferia iria sacudir a cena musical local. Chico Science junto com alguns amigos conseguiu desentupir as veias da “Amsterdã das Américas” criando de fato, o único Pop nacional. Em 1984. Quando Chico ainda não era Science e se auto-intitulava “Chico Vulgo”, integrou a Legião Hip Hop. Nome dado a um dos principais grupos de break do Recife. Organizava as festas eletrônicas na cidade, da divulgação e locução aos mínimos detalhes como checagem de som, iluminação, etc. Apaixonado por música Latina, Eletrônica e Regional, dono de um parque de diversões na cabeça, Chico forma sua primeira banda batizada Bom Tom Rádio, foi mais um “embrião” de banda que uma banda propriamente dita, mas já havia mistura de alguns ritmos como a junção de scratchs com cantigas de emboladores. Foi dessa banda que saíram bases para algumas músicas gravadas posteriormente pela Banda Chico Science & Nação Zumbi, como A Cidade e Samba do Lado. A primeira banda mesmo se formou em 1987 e tinha o nome de Orla Orbe (trecho de uma praia muito visitada pela turma de Chico). Depois da Orla Orbe veio Loustal (cujo nome era inspirado no famoso quadrinista francês Jacques de Loustal) A idéia era misturar os ritmos do soul, funk e hip hop, com rock dos anos 60 e 70. Começava assim a se formar a “Seattle do quarto mundo”.

Em 1991 Chico se funde com o bloco Afro Lamento Negro de Peixinhos (bairro periférico e super populoso de Olinda), ao se juntar com o Lamento Negro, Chico e o bloco misturam maracatu, coco de roda, caboclinho, frevo, ciranda, samba e embolada junto ao Hip Hop com rifs e solos de Guitarras de rock, numa mistura bem psicodélica e inovadora jamais vista antes. Sem duvidas, a mistura que Chico fazia era peculiar, algo diferente e atípico. Chico tirava som dos cascos das cervejas. Foi um alquimista dos ritmos, um cientista das melodias, o engenheiro responsável pelo projeto arquitetônico na construção do ritmo Mangue Beat. Seu ponto forte era misturar os diversos ritmos a melodias regionais, junto com letras que falavam de Amor, Banditismo, Messianismo e Injustiça Social. Suas influências musicais iam desde os vendedores ambulantes do Mercado Central de São José, até as festas populares e os grupos de break americano. Seus ídolos eram: James Brown, Grand Master Flash, Afrika Baambata, Jorge Ben Jor, Bezerra da Silva, Roberto Carlos, Gilberto Gil, Luiz Gonzaga, Mestre Salustiano, Jackson do Pandeiro entre outros. Tais ídolos futuramente viriam a exercer um papel de suma importância para as futuras criações rítmicas de Chico.

O Apelido Chico Science foi herdado de um tio de Renato L. O tio de Renato Lins se chamava Carlos Antônio Ramos Braga e o Science “caiu como uma luva” para Chico, pois em sua cabeça existia um laboratório sonoro. Chico com seu espírito praieiro captava nas antenas da Manguetown (Recife) sons que vinham de outros pontos geográficos e ecoava nos ouvidos das Calungas e dos Caboclos de Lança dos Maracatus de Baques Virado e Solto. Isso tudo completado com Guitarras envenenadas e “hendrixmente” distorcidas por Lucio Maia. Essa mistura é o que gera esse ritmo tão contagiante, pode-se assim ser classificado como uma completa “sopa de melodias.

Desde o principio da cena, Chico propôs que seria um movimento antenado com o que estar acontecendo no mundo, familiarizado com a internet, interessado por ficção científica, quadrinhos, pinturas, teatro, preocupação com a degradação do meio ambiente, cinema, dança e música, claro. Enfim, todo tipo de arte. Porém, sem jamais perder o regionalismo reintegrando a cultura popular e o folclore ao convívio cotidiano, tornando assim a idéia de identidade do ser pernambucano ou nordestino mais forte.

Era período carnavalesco (dia de Yemanjá), começo de noite de domingo, o transito é insuportável tanto centro-orla quanto centro-bairro. O Landau de Chico (chamado carinhosamente por ele de “Papa-gasolina”) era largo e difícil de estacionar, então ele resolveu pegar emprestado o Fiat Uno branco da sua irmã Goretti e sair para a concentração do bloco carnavalesco Liga da Justiça. Na mesma noite do dia 02/02/1997, às 19:00Hs dá entrada no hospital da Restauração um corpo acidentado, batida de carro na divisa entre Olinda e Recife, mais precisamente nas imediações do shopping Tacaruna. Tem fim a vida de só mais um Francisco de Assis, porém, para a música morria Chico Science. O curioso é que próximo ao acidente havia um outdoor estampado com Morais Moreira e os dizeres “ Quer morrer, F.D.P?”. A principio corriam boatos que o fatal acidente acorrera com Chico Cesar, mas ao desenrolar dos fatos, viu-se que era Chico Science. A comoção com a morte do principal mentor da cena Mangue tomou conta não só das ruas da capital pernambucana como também de boa parte do país, chegando a repercutir mundialmente. O The New York Times (maior jornal norte americano) na edição da manhã de 05/02/1997, em três colunas escritas por John Pareles, deu destaque a fatalidade, noticiando a morte de Science com o titulo: Chico Science, 30, Estrela da Música Brasileira.

O laudo policial do acidente sofrido por Science no complexo do Salgadinho é formado por 174 páginas e constatou que ao colidir, o veiculo se encontrava a 110 km/h, limite aceitável, tendo em vista que na avenida do acidente é permitida alta velocidade, pois é uma reta longa e larga, o inquérito do respectivo acidente foi concluído em 2007, após 10 anos de sua morte. À juíza Ângela Melo, da 5ª vara cível de Olinda deu parecer favorável à família França, exames feitos no corpo não detectaram teor alcoólico, nem nenhum tipo de substancia ilícita. Portanto, ficou esclarecido que o ocorrido no desastre não foi falha humana e sim falha mecânica, pois, a parte metálica do cinto de segurança que é projetada para prender o condutor e/ou os passageiros presos ao banco falhou e se rompeu, dando fim a uma das mais brilhantes e criativas mentes que o Brasil viu. Chico sofreu traumatismo craniano, afundamento no tórax (devido ao impacto no volante) e fraturas múltiplas na face. À medida que a notícia da fatalidade se espalhou, as orquestras de Frevo de Olinda e Recife iam parando até que por fim, o carnaval naquele ano parou literalmente.

O governador da época, Miguel Arraes, decretou luto oficial por três dias. Seu velório ocorreu no Centro de Convenções onde 6.000 (seis mil) pessoas compareceram para prestar a ultima homenagem ao ídolo. Entretanto, seu sepultamento aconteceu no cemitério Santo Amaro. No caixão, coberto pela bandeira de Pernambuco, havia também um chapéu de palha e dois caranguejos. O corpo é sepultado às 17:10hs sob o som melódico de uma rabeca. 

Hoje, no Espaço Ciência (localizado de frente a colisão) existe o Manguezal Chico Science, o mesmo fica localizado no parque Memorial Arcoverde (em frente à escola Aprendiz de Marinheiro) e tem uma área de 19.169 m², o pai de Chico atualmente trabalha no local. Existe também no bairro do Recife Antigo, Rua da Moeda, uma escultura homenageando o “Mangueboy”, a escultura retrata o corpo de Science em tamanho real multicolorido, sobre um caranguejo. Pelas ruas e avenidas do Recife e Olinda vemos em vários muros, praças e viadutos. Grafites homenageando o cantor e o movimento Mangue, hoje a identidade Mangue Beat já está bem difundida e sólida em relação há 15 anos atrás.

Há contra ponto, o que se vê hoje é uma cultuação ao “mito” Chico Science, Chico se transformou em uma espécie de “Bob Marley” da América do Sul, em certas ocasiões podemos observamos um tipo de “Guevarismo” criado para enaltecer a lenda urbana surgida a partir da trajetória de vida de Chico, como se a memória de Chico Science precisasse ser equiparada a outros ícones, Science foi um Mangueboy como qualquer outro, a única diferença é que ele começou tudo isso.

Chico do fundo do rio poluído tirou da tarrafa (tipo de rede) meia dúzia de peixes que logo fizeram agitação no aquário musical recifense. Mesmo tendo a vida fisgada pelo anzol do destino, Chico deixou seu legado que é passado adiante por Jorge Du Peixe e outros “caranguejos com cérebro”.

*Hoje fazem exatos 15 anos que Science não está mais entre nós, mas ele deixou um legado de alegria, inovação e consciência em suas obras. cabe a nós não deixarmos essa história nas páginas do esquecimento. Chico Vive!

Nenhum comentário:

Postar um comentário