Nos antigos livros didáticos de estudos sociais tínhamos que decorar a “mistura” do branco com índio, branco com negro e negro com índio. Tais misturas resultariam nas “sub-raças”: caboclo, mulato e mameluco. Confesso que era um saco ter que decorar tal formula metódica e chata. Porém, eu tive que recapitular esse assunto para chegar onde eu quero. Pois bem, no artigo de hoje falarei de forma bem sucinta (assim espero) sobre o Caboclinho. Sabendo que Caboclo é a mistura do branco com o índio, caboclinho seria a grosso modo; o filho do caboclo. Portanto, de origem indígena, o Caboclinho é uma das manifestações culturais mais antigas do Brasil. A quem diga que é a mais antiga e já era realizada por essas bandas antes mesmo da chegada dos europeus. Seu registro oficial data de 1584, no livro “Tratado e Terra da Gente do Brasil” do padre Fernão Cardim.
O Caboclinho com o passar do tempo sofreu alguns desfalques, um bom exemplo são as canções. Sendo de origem indígena, suas letras eram passadas de forma oral, ou seja, de pai para filho, já que os índios brasileiros não possuíam escrita. Durante o extermínio promovido pela coroa portuguesa, várias tribos foram extintas e com seu povo morreu também parte do folclore Caboclinho. O pouco que ainda resta é encenado no carnaval e principalmente nas cidades do interior do estado nas festas de padroeiro (a). Curiosamente o que podemos observar é que até o Caboclinho de certa forma sofreu um sincretismo religioso, já que foi criado para perpetuar a cultura e as crenças indígenas, hoje não deixa de ser uma encenação de caráter sagrado, porém agora, para a igreja católica (igreja essa que por sinal contribuiu e muito para o extermínio das tribos).
Musicalmente (segundo estudiosos) no Caboclinho não há nenhuma influência européia. Alguns pesquisadores comparam sua musicalidade com algo oriental, lembrando as canções Hindus, Árabes ou Chinesas. Uma característica marcante do ritmo é a forte marcação dos Trupés (pisadas dos pés no chão), que tem como finalidade fazer a base para os outros instrumentos como: surdo, inúbia (flautim de taquara) ou pífano, reco-reco, caracaxá, maracá (tipos de ganzá) e caixa (tarol). O ritmo por ser um ritmo de guerra e a dança representar as batalhas, o Caboclinho se torna muito marcante para quem assiste sua apresentação. A encenação se torna mais real quando os dançarinos em posse das suas preacas (arcos e flechas) criam estalidos durante as coreografias. A dança é tão bem executada que parece fazer os (as) dançarinos (as) flutuem. Tal ilusão de ótica se dá pelo fato da dança ser rápida e do baixar e levantar dos dançarinos (apoiados pela ponta dos pés e calcanhar), é tanta agilidade que até parece que os dançarinos tem molas nos pés. A indumentária dos brincantes é de uma exuberância sem igual, enfeitados (literalmente) dos pés à cabeça, os homens e as mulheres usam cocares e saias de penas de avestruz, ema e/ou pavão, se adornam também com cabaças na cintura, colares de sementes no pescoço, pulseiras e tornozeleiras bastante coloridas.
Sabemos que toda e qualquer manifestação cultural que retrata a vida social de um povo é constituída de hierarquias, com as tribos indígenas não seria diferente, no Caboclinho há também a famosa hierarquia. Os brincantes no espetáculo se dividem em: cacique, índia-chefe (mãe da tribo), pajé, capitão, tenente, pêros (indiozinhos e indiazinhas), porta-estandarte, caboclos de baque (músicos, geralmente quatro) e os caboclos e as caboclas.
Uma duvida muito comum é se o Caboclinho pernambucano e os Grupos de índios paraibanos são a mesma coisa. Friso eu, que apesar de serem muito parecidos, nas duas manifestações há algumas diferenças. Por exemplo: no Grupo de Índio não há o uso das preacas, sendo substituídos por lanças e machadinhas. Outra diferença peculiar desses dois grupos é a maneira de se pintar e a posição na apresentação. Geralmente os Grupos de Índios são batizados com nomes de tribos as quais há de maneira direta ou indireta descendentes, enquanto que no Caboclinho não é necessário se ter sangue indígena.
Além do cunho religioso e guerreiro na execução do Caboclinho, também há a prece da farta colheita e boa caçada. Como vimos acima, o Caboclinho é uma manifestação cultural que prima em passar a diante a cultura (ou o pouco que sobrou) indígena, suas batalhas, suas vitórias, seus heróis, etc. O Caboclinho é guerreiro e resiste assim como os próprios nativos brasileiros. Apesar dos pesares, a tradição (tanto nas tribos quanto na cidade) ainda é passada de pai para filho, tornando assim mais forte a ligação entre o mesmo sangue, o sangue brasileiro. Viva a miscigenação!
Nenhum comentário:
Postar um comentário